Theater — novo filme de Kento Yamazaki (escondido na Amazon Prime) é uma crônica sobre as frustrações juvenis
Acredito que a maioria dos telespectadores de dramas japoneses já assistiu algo com o Kento Ymazaki. Famoso por protagonizar várias produções live action como Wotakoi, JoJo’s Bizarre Adventure, One Week Friends, Your Lie in April, Orange, Heroine Shikkaku, L-DK, Another e Death Note, o ator surpreendeu o público ao apresentar um papel diferente de todos que já interpretou.
Em ‘Theater: a love story’, Kento é Nagata um dramaturgo independente, frustrado com os rumos da vida que um dia encontra Saki (Mayu Matsuoka) enquanto observavam a vitrine de uma galeria de arte. O flerte acontece e começam a namorar. A sinopse é simples e título do filme indica que teremos vários momentos melosos pela frente…só que não.
ANSIEDADE
“Quanto tempo vou durar?”
A ansiedade de Nagata chega a ser perturbadora para quem assiste, mas quando olhamos pelo ponto de vista do personagem temos uma empatia imediata. Desde que teve contato com a literatura teatral, via o amigo Nohara no ensino médio, Nagata escrevia peças e mantinha uma companhia de teatro independente.
Seus trabalhos não eram bons e recebiam críticas duras na imprensa especializada. Chegando ao ponto de seus melhores amigos decidirem dar um ‘chacoalhão’ sobre a continuidade ou não dos trabalhos.
Quando encontra Saki, o flerte desenvolve e passam a se relacionar. A dose de autoconfiança volta para Nagata, pois os sentimentos da namorada o revigoravam. Por outro lado, o espectador fica um tanto desconfortável com passividade de Saki. O egocentrismo de Nagata o cega. A ânsia de fazer sucesso ou seria a necessidade de provar que era talentoso o deixava cada vez fechado em si mesm. Ainda que estivesse em um relacionamento.
MELANCOLIA
A beleza, doçura e simpatia de Saki contrasta com o ser ansioso e perturbado de Nagata. Enquanto ela o ajudava a desabrochar como dramaturgo, sua personalidade sumia. O sorriso sempre presente em sua face escondia um nervosismo que intriga o público.
O egoísmo potencializado pela ansiedade de fazer dar certo de Nagata provoca na radiante Saki uma melancolia profunda. Seus problemas particulares explodem e relacionamento de mão única anuncia sua crise.
Como mulher e todas as subjetividades sociais que o gênero carrega, Saki trinca como um cristal cansado de ser admirado. Ela chora, se entrega aos vícios, ao trabalho e cria uma expectativa de um relacionamento ideal (à sociedade, diga-se) que Nagata mal sabia que fazia parte.
A sociedade é maldosa com os jovens que não alcançam o sucesso, e mais ainda com as mulheres que não seguem o script do bom casamento ou sucesso na carreira. Se impor para demarcar o seu espaço, requer também uma força para demonstrar a sua independência e poder. O que reforça o estereótipo das mulheres imponentes sem uma ‘gota’ do que chamam de feminilidade.
Quando explode, Saki fala sobre suas frustrações, retorno à sua cidade natal e que Tóquio não a favorece. O desabafo de Saki coloca pra fora suas feridas e evidencia o quanto encaixotar o feminino em caixinhas tolhe a mulher.
(DES)ENCONTRO
Na ficção aprendemos que há encontros que acontecem para nos fazer aprender. Será no desencontro que encontraremos a nós mesmos. A medida que Saki e Nagata foram percebendo que faziam ‘bem’ um ao outro, a separação é inevitável. Ainda que com fim, descubram o forte sentimento que os unem.
O tempo se mostra, mais uma vez, dono de tudo. Como nas clássicas tragédias, faz o seu papel em girar a roda fortuna dos personagens e cada um busca o seu caminho.
NÓ(S)
O último ato é incrivelmente belo. Nagata dissolve seus nós. Com o teatro, Saki e a vida. Enquanto, Saki assiste na plateia e emociona-se com o caminho que percorreu para que pudesse ser dona de si.
CONSIDERAÇÕES
“Theater: a love story” tem um ritmo lento e pode te fazer abandonar o filme. Mas se você gosta de redenção de personagens, romances reais e que te fazem questionar sobre seu comportamento com o outro, o filme é uma ótima pedida. Sem contar o exercício de reflexão crítica sobre a juventude que não se encontrou ou simplesmente foi ‘obrigada’ a se encontrar.
BÔNUS
A atriz Mayu Matsuoka, que interpreta Saki, é excelente. Mesmo que o desenvolvimento da sua personagem leve um bom tempo para acontecer, sua carga dramática nos prende na expectativa de que algo. O seu sorriso sempre presente chega a ser perturbador. Quando ela assume a versão melancólica da personagem temos uma OUTRA Saki.
Claramente após o filme fui pesquisar a atriz, Mayu tem apenas no currículo Shoplifters — filme vencedor da palma de ouro em Cannes 2018 do aclamado diretor japonês Hirokazu Koreeda.
Coisa pouca, né?! Fiquemos com o trailer do filme das lendas: